O passado da nossa terra visto pelos olhos de quem sabe. Neste dia de carnaval, em que queremos só pensar no presente e esquecer os problemas da vida, propomos olhar para as tradições de outros tempos.
Por David Fernandes*
As tradições do Carnaval “à portuguesa” ou Entrudo, antes de certa “abrasileirização” do Carnaval, tinham nas Cegadas (cantos e marchas carnavalescas), na queima do Judas, e no Enterro do Bacalhau (ou do Entrudo), expressões genuínas de Festa, misto de alegria, purga de tempos aziagos e vivências do excesso. O Entrudo era o fim da invernidade física, antes da invernidade moral da Quaresma, que se iniciava logo na quarta-feira, com jejum, penitência e frugalidade, na lógica da preparação da Páscoa.
Vila Franca de Xira não era excepção. Aqui, começavam sempre no dia 22 de Janeiro, dia do padroeiro da Vila, São Vicente. Nessa noite, passadas as “santidades d’igreja”, soltava-se a “primeira perna do Entrudo” e iniciavam-se os “desaforos” pondo a nu, as hipocrisias sociais da Vila. Até à Quaresma havia récitas, arraiais e folias populares.
Embora se tenham perdido completamente, Vila Franca teve quase cem anos de tradição de Cortejos Carnavalescos, muito antes de localidades próximas, com tema, músicos e grande pompa. Só para que se tenha uma ideia, o “Enterro do Bacalhau” de 1935, teve direito a centenas de figurantes, incluindo uma filarmónica inteira, que tocou o “Fado do Bacalhau”.
Depois dos anos 50, foi diminuindo o impacto e só excepcionalmente se fazia, na penumbra da noite, o Enterro do Entrudo, com grandes lamúrias, carpideiras e a azémola com o caixão, normalmente já dentro da Quaresma, depois da meia-noite de Quarta-Feira de Cinzas…
Nos anos 70, e nas décadas seguintes (no século XXI houve uma nova edição), os aficionados da terra reinventaram a matriz carnavalesca da Vila, sincretizando-a com a sua identidade taurina, tendo havido várias edições de Carnavais Taurinos.
Independentemente da temática do Carnaval, a lógica dos foliões era a da purga dos males velhos da Vila, para construir depois uma nova Terra cheia de Futuro… Sem saudosismos, se calhar era altura de revisitar velhas tradições e vestir à Cidade um novo “destrajo” (fato de carnaval). Veremos que o Povo de Vila Franca não falta à Festa!
*é estoriador e cronista na gira
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