Tivemos os melhores resultados de sempre



António Dias: Tomou posse em 2012. Qual o balanço que faz do seu trabalho na Companhia das Lezírias?
António Saraiva: É difícil resumir tudo numa simples resposta. É claro que é uma satisfação pessoal ser presidente de uma empresa tão emblemática como esta. É uma instituição da qual qualquer português já ouvir falar. Quando aceitei o convite, achei que podia contribuir de uma maneira positiva. Sou engenheiro agrónomo e a minha experiência empresarial poderia ser uma mais valia. Pensava que podia acrescentar qualquer coisa e, atualmente, sinto-me muito realizado e sinto que ainda há muito para fazer.
Encontrou uma empresa estável e com as contas em ordem. Quais eram os desafios?
Tentar modernizar a gestão da empresa e torná-la mais conhecida por parte do público. Demonstrar que este podia ser um sítio onde a agricultura moderna funcionava em harmonia com o ambiente, podendo ser um laboratório vivo e, claro, melhorar os resultado de gestão.
O trabalho de marketing tem existido.
Sim, há projetos de birdwatching, como o Espaço de Visitação e Observação de Aves (EVOA) que tornaram a Companhia das Lezírias mais conhecida. Foi aqui gravado, há uns tempos, um programa de televisão. Temos que aproveitar todas as oportunidades para mostrar o trabalho que é aqui desenvolvido. A Companhia é uma marca de referência para muita gente e muito respeitada. Às vezes, o que fazemos é criticado, noutras somos elogiados. Mas a nossa atividade é muito diversa e queremos comunicar isso. Costumo dizer, quando falo com as pessoas, que todos os portugueses são bem vindos aqui porque esta propriedade é de todos os cidadãos. Somos todos “donos” de parte deste território.
É claro que começamos por introduzir pequenos quick wins, como parar o investimento desnecessário, que normalmente é visto como "rampa de lançamento” de novas administrações para mostrar trabalho feito. É uma tentação e que nem sempre resulta bem. Interessou-nos mais capitalizar o que já havia e que era muito bom. Dou como exemplo o olival que, com uma área de 70 hectares, era pouco produtiva e era necessário rentabilizar. Na área dos vinhos, já partimos de um patamar de qualidade, apenas redesenhámos os conceitos, o modo de trabalhar, as instalações, redefinimos o portefólio das marcas. Na área dos arrendamentos rurais, onde arrendamos cerca de 5.700 hectares, introduzimos alguma racionalidade e harmonizámos as rendas. E, claro, depois foi fomentar o espírito de equipa, a colaboração entre setores... no fundo, áreas que são pouco visíveis, mas que são o óleo que fazem funcionar o motor.
Os números têm correspondido?
Sim. Em 2015 tivemos os melhores resultados de sempre, com os lucros a ultrapassar a fasquia dos 1.200.000 euros. E é de sublinhar que partimos de um patamar difícil, com uma série de investimentos ainda sem retorno e que nos estão a absorver os resultados, como é o caso do EVOA, que ainda está numa fase de lançamento, e a Coudelaria de Alter, uma entidade que nos foi entregue em 2013, e que representou 470 mil euros de resultados negativos. Porém, isso não nos preocupa. O EVOA está a crescer e a Coudelaria é uma responsabilidade pública. É lá que são criados os mais emblemáticos cavalos portugueses, os Lusitanos, e que são montados na Escola Portuguesa de Arte Equestre. Estamos a fazer serviço público e de preservação de património genético.
Com tantas áreas de negócio, teme dispersar-se?
Em extensão é seguramente um território enorme (18.000 hectares) mas onde 8.000 hectares são floresta e que necessitam de um tipo menor de preocupação e gestão. Acho que a diversidade é a nossa maior riqueza, porque nem sempre pomos os ovos no mesmo cesto, certo? E até há quem nos diga o contrário, que devíamos rentabilizar mais todos os nossos terrenos que estão arrendados, por exemplo. Contudo, não temos estrutura, nem escala, para alargar a nossa área de administração direta. O trabalho que fazemos está a correr bem. A nossa floresta, por exemplo, é considerada de gestão modelo e aqui podemos dinamizar as boas práticas em regime florestal. Na parte do olival, se tivesse sido eu talvez não o tivesse instalado. Já cá estava e acho-o um produto muito importante. Se faz sentido ter vinha? Completamente. São 130 hectares que estão a ser renovados, podemos produzir mais, é um ótimo mecanismo de comunicação, com mais de 700.000 mil litros de vinho por ano. Vendemos tudo engarrafado ou embalagens de cartão, e cada uma é um mensageiro que chega a muitos sítios, muitas vezes fora do país. E cresceu tanto que passou a ser o produto número um da Companhia das Lezírias.
Volta e meia, há ainda quem fale da privatização.
Pois eu acho que faz cada vez mais sentido a empresa continuar pública. É um sítio que pode ser utilizado para disseminar boas práticas agrícolas e ambientais; temos uma relação intensa com diversas universidades do país; podemos ser um local perfeito para investigação e desenvolvimento; somos reconhecidos pelo nosso valor acrescentado; e nunca nos podemos esquecer que mais de metade do território da Companhia está em áreas de proteção ambiental e de aquíferos essenciais para o país.
E que acha de privatizar determinados setores?
Não digo privatizar mas ceder, trabalhar em conjunto. Isso, sim. Falo, por exemplo, da área do turismo equestre, que representava uma fatia muito pequena, menos de cinco por cento, da nossa empresa, e que decidimos encerrar. E estamos agora no mercado a consultar parceiros que estejam interessados em desenvolver esta atividade. A produção de arroz já é feita dentro de uma organização de produtores, a Orivárzea. São bons exemplos que se podem seguir.
Como engenheiro agrónomo, deve ser bom sentir-se "dono" de tantos terrenos.
(risos) Nas empresas onde trabalhei, no setor dos fitofarmacêuticos, a nossa estratégia era tentar pensar o máximo como um agricultor. Desenvolvíamos muitos estudos e pesquisas para perceber o que estaria nas suas cabeças e podia lá imaginar eu que, um dia, estaria na sua pele. Aprendi imenso. E ver a passagem do tempo na terra é fascinante e muito sedutor. Se fosse ministro da Agricultura, que medidas tomava de imediato? (risos) Nunca seria capaz de o ser. Tenho capacidades, só que sou muito exigente comigo próprio. E conhecendo-me bem, sei que nunca estaria descansado. É um cargo tão absovente que acredito que teria, a nível pessoal, um custo demasiado elevado. Ainda assim, considero que o caminho do regadio pode ser bem trilhado; deve-se continuar a apostar na especialização; e nunca podemos esquecer a organização da produção. Qual a sua opinião sobre a agricultura em portugal? Desenvolveu-se muitos nos últimos anos, sobretudo a nível tecnológico. O problema mantém-se a nível da estrutura e da cooperação. Falta-nos a organização entre todos. A Orivárzea é bom exemplo de como deve ser trabalhar no futuro. É tudo uma questão de tempo e adaptação. Com a crise, houve um novo reconhecimento da importância da agricultrura. Antes, este era o “patinho feio da economia” que virou o cisne e as pessoas perceberam que afinal o agricultor não é o tipo que anda com uma enxada às costas mas que até pode estar em casa a controlar as suas culturas a partir de um computador. Há quem diga que não temos o clima do norte da Europa mas, caramba, temos coisas que eles não têm! Em muitos “testes cegos” a produtos alimentares, ficamos sempre nos primeiros lugares. Isso diz alguma coisa! Mas não foram cometidos erros no passado com fundos europeus mal atribuídos e políticas de investimento erradas? Foram oportunidades perdidas mas acho que ganhámos mais consciência. O governo quer chegar a 2020 com o equilíbrio da balança agrícola e isso é perfeitamente exequível. Mas olhar para o passado não adianta de nada. Temos que parar de chorar sobre o leite derramado.

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